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Mas afinal o que é a via romana?

Quando iniciamos este projecto, a ideia era compilar o conhecimento disponível sobre viação romana e torná-lo acessível a todos. Ora, a melhor maneira de o fazer seria publicar online roteiros de viagem percorrendo estas vias, seguindo o espírito inicial do chamado “Itinerário de Antonino”, um documento essencial para a identificação dos trajectos romanos, até porque à época não existia praticamente nada online sobre o tema.

Rapidamente se tornou claro que o estudo da viação romana permanecia enterrado num lamaçal de conjecturas e de grandes dúvidas não só sobre o traçado da via como sobre as localização das estações mencionadas no Itinerário que na verdade. nos remetem para uma realidade pré-romana, facto evidenciado pelo grande número de topónimos indígenas listados no documento como estações viárias (a larga maioria), sendo em todos os casos podemos associa-las a povoados da Idade do Ferro, vulgarmente chamados de “castros”.

É provável que o documento tenha origens na conquista militar e subsequentes guerras civis, acabando por fixar as principais rotas que interligavam os centros estratégicos do domínio romano utilizando as mesmas rotas da Idade do Ferro. O objectivo era naturalmente exercer esse domínio controlando o trânsito que circulava nesses eixos, mas acima de tudo, uma forma de controlar o acesso à enorme riqueza metalífera que caracteriza a Península Ibérica, cujo valor económico estará na origem da conquista romana.

O desenvolvimento que se seguiu é assim em parte a continuidade dessa realidade pré-romana, reflectindo o modelo de povoamento adoptado durante a Idade do Ferro, caracterizado pela instalação de povoados nas proximidade dos eixos viários, obrigando à sua fortificação com grossas muralhas, ao contrário do período anterior, a Idade do Bronze, onde se dá preferência por assentamento nos picos dos montes, longe da estrada e protegidos de potenciais inimigos, dispensando por isso a construção de um recinto amuralhado. Trata-se obviamente um quadro geral onde cabem várias excepções.

Consequentemente , a chamada “via romana” assenta invariavelmente sobre antigos percursos da Idade do Ferro, sofrendo posteriormente diversos benefícios que viriam acrescentar uma transitabilidade que não possuía antes. Assim, seria mais correcto falar em “vias antigas” ou “milenares” do que “vias romanas” dado que não foram propriamente os romanos que traçaram e construíram a estrada . Por outro lado a visão geo-estratégica romana era de máxima exploração económica e o que interessava era assegurar o controlo por parte do poder Imperial das principais explorações mineiras.

Esta constatação está reflectida também na epigrafia relacionada com as importantes explorações de Las Medulas (Ponferrada, León) e Trêsminas (Vila Pouca de Aguiar), evidenciando em ambos os casos um controlo directo destas explorações por parte do poder Imperial. Aliás, o forte investimento levado a cabo nas vias que partiam de Braga ao longo de todo o período Imperial é bem o reflexo dessa necessidade de exercer controlar esta vasta região mineira que se estende até Asturica, facto reflectido no grande número de miliários de diferentes imperadores registados nestas vias que interligavam as sedes dos conventos Lucencis, Bracarensis e Asturicensis.

Fora estas vias, em tudo excepcionais, mesmo no contexto romano, todas as outras não contam mais do que uns quantos miliários, bastante mais espaçados, assinalando pontos importantes do percurso, nomeadamente estações viárias. A existência de restos de estruturas atribuíveis ao período romano nestes locais indiciam a presença de um estabelecimento viário para apoio aos viandantes. Esta marcação mais espaçada face às vias do noroeste peninsular é reflectida no menor número de miliários conhecidos a sul do Douro. Por exemplo em todo o Algarve, uma das regiões mais “romanizadas” do país, apenas se conhece um miliário, e mesmo este tem características singulares que o destacam dos demais encontrados em território nacional.

O outro aspecto relevante na interpretação dos itinerários é que não se trata de uma compilação de vias como se tem afirmado (na verdade, a designação de “Vias” foi aposta numa das cópias medievais, assim como a numeração), mas sim de grandes rotas, interligando o máximo número de pontos relevantes, fornecendo aos viandantes uma súmula dos principais trajectos e das respectivas distâncias intermédias. Assim quando se diz que havia três vias para Mérida, uma por Évora, outra por Alter do Chão e outra mais junto ao Tejo (as chamadas Via XII, XIV e XV, respectivamente), não temos propriamente três vias rumo Mérida, mas três itinerários diferentes, que vão utilizando troços de vias independentes, formando uma grande rota.

Aliás, tudo indica que o trajecto principal seria a variante por Alter do Chão quer por ser o traçado mais curto quer pelo facto de esta ter recebido diversos melhoramentos, nomeadamente com a construção de grandes obras de engenharia como a Ponte Romana de Vila Formosa. Assim, tudo indica que esta seria a grande via que ligava Mérida ao Rio Tejo, formando uma via com caput viae em Santarém e Mérida. Notar também que a escolha de Mérida para capital da Lusitânia está seguramente relacionada com o facto de aqui fazer-se o cruzamento do Guadiana, sendo portanto esta via que permitia a ligação mais curta de Mérida ao mar, ou sejam entre esta travessia do Guadiana e o Tejo, com os seus portos fluviais dispostos ao longo das suas margens e aproveitando o vasto estuário da boca do rio, aceder à rota marítima para o Mediterrâneo.

A formação de Portugal e as consequentes disputas fronteiriças com o Reino de Espanha acabaram por ditar o abrandamento de algumas das grandes rotas comerciais da antiguidade, mas para além destas alterações forçadas, a rede viária romana permanece em utilização pelos séculos vindouros e ao contrário do que se tem dito não desapareceu completamente da paisagem (seguindo o velho mito de que todo trajecto romano era lajeado), mas permanece em utilização agora como estradas municipais ou caminhos agrários, apesar dos atentados que tem sofrido durante a última centúria.

Pelo contrário, o que se verifica no terreno é uma grande resiliência destes trajectos milenares seja transformados em estradas modernas seja como caminhos já quase imperceptíveis nos altos das serras, e o seu valor natural, patrimonial e histórico acabará por vir à superfície o que irá induzir uma reabilitação destes trajectos, criando para estes caminhos um futuro alternativo que os possa retirar do actual oblivium. 

Mapa Viário Romano com os principais eixos e respectivas estações de paragem (@pedro.soutinho)

The crossing of the River Alva at the Mucela Bridge

One of the main itineraries that crossed the portuguese territory had origin in the city of Conímbriga, crossing the «Beira Alta» region towards the river Douro, passing in Bobadela, Celorico da Beira (where it crosses the Mondego River), and through the territory of the Civitas Aravorum (Marialva), linked to important crossings of the Douro, one in Quinta de Vesúvio/Sra. da Ribeira and another on Monte Meão/Foz do Sabor (and not for Salamanca as had been said).

This itinerary has been associated to the so called “Estrada da Beira” (Beira Road) that starts in the city Coimbra and links to Celorico da Beira, but the direction of this route clearly indicates that its origin was in Conímbriga and not in Coimbra. A possible branch connecting to Coimbra, although not impossible, does not seem feasible, since the derivations of the route connect not to Coimbra but to fluvial ports in the Mondego (namely Porto da Raiva and Penacova). Although there are tracks on the other bank, these seem to be heading northwest and not towards Coimbra, which further weakens this hypothesis. Inevitably, these tracks end up crossing the route coming from Viseu towards Coimbra, and thus can follow this way that city, but the various inflections in the way are not consistent with the existence of an independent track linking Coimbra to Bobadela.

If there are doubts about the final destinations of the road, the place where the road crossed the River Alva is unanimous, pointing to the area of «Ponte da Mucela», a traditional crossing point since the Middle Ages. In the book Monarquia Lusitana, Fray Francisco Brandão transcribes an inscription that was placed on the medieval bridge, commemorating its construction in 1295, during the reign of King Dinis. However, the identification of some Roman stones that were reused in the medieval construction supports the hypothesis of an earlier Roman bridge, perhaps further downstream, near the Roman settlement of Moura Morta, where the crossing is much easier.

Changes introduced to the route Via Conímbriga – Bobadela at the crossing of the Alva River (red line), near the Roman settlement of Moura Morta and crossing of «Serra do Bidueiro» near the megalithic «mamoa» of S. Pedro Dias.

The settlement is located on a meander of the River Alva, which surrounds the settlement on all sides but the southern side, from where the site was accessed. However, the strong cliffs on the other bank make it impossible to cross at the base of the settlement. However, between this place and the bridge, there is a more favourable area to cross the river, taking advantage of a hump that exists there to start the ascent of the hillside in gentle steps. In fact, the passage through this area might not even require the construction of a bridge, in which case, the Roman ashlars  could have come from the village of Moura Morta itself, which is only about 1 km from the current bridge.

But independently of the question if the existence of a Roman bridge, everything points for the crossing here of the river for the reasons explained above and also because this tracing is in line with the mile sequence between Conímbriga and Bobadela. In fact, the distance from Conímbriga to the Alva River through the proposed route totals 29 miles (typical value between stages), and the 27th mile points to the top of the mountain gateway of Serra do Bidueiro, next to megalithic monument called «Mamoa of S. Pedro Dias» (a pilgrimage to this site takes place everyear), showing once again the great antiquity of this route, at least as a footpath.

This correction also allows us to match the sequence of miles with the only known station in this route, located in Eira Velha (unfortunately recently destroyed by the construction of the Coimbra-Tomar section of the A13 highway, another avoidable destruction of Roman structures next to the road), which is located 22 miles from Rio Alva and seven miles from Conímbriga. This track continued westwards until the town of Soure (eventually a river port of the Mondego), where a milestone was found.

Regarding milestones, there are only three on this route, all of them found near Seia, at the crossing with another major road, the route from Viseu to São Romão castrum (c. Seia), so we do not know for sure which of the two routes was marked by milestones.

The only one that still keeps part of the inscription is from Imperor Maximiano, indicating XXI miles, a distance compatible with Bobadela and Celorico da Beira, but which seems more appropriate to the latter, in this case marking the distance to the Mondego River. It is currently located in the garden of a rural tourism house in Paços da Serra. Recently, another milestone (anepigraphic) was identified near the Santa Comba cemetery, which is most probably in situ, and is therefore decisive to adjust the milestone sequence. The third one was identified nearby, in the village of Vila Chã, and it was reused as support of a balcony of a house, whose morphology and proximity to Santa Comba supports the hypothesis that it is in fact another milestone of this route.

Returning to the crossing of the Alva river at Mucela, the Moura Morta site does not have any sign of a previous Iron Age occupation, which means that it was established by the romans, eventually to control this passage (possibly a statio). However, until the settlement is excavated, nothing more can be added.

O cruzamento do Rio Alva na Ponte da Mucela

Um dos grandes itinerários que cruzava o nosso território tinha origem em Conímbriga e cruzava a Beira Alta rumo ao Rio Douro, seguindo por Bobadela, Celorico da Beira (onde cruza o Mondego), seguindo depois por Mêda Civitas Aravorum, bifurcando para duas importantes travessias do Douro, na Quinta de Vesúvio/Sra. da Ribeira e Monte Meão/Foz do Sabor ( e não para Salamanca como é comum afirmar-se).

Este itinerário tem sido associado à chamada “Estrada da Beira” que partia de Coimbra rumo a Celorico da Beira, mas directriz deste trajecto aponta claramente para que sua origem estivesse em Conímbriga e não em Coimbra. Um possível ramal ligando a Coimbra, ainda que não impossível, não parece viável, sendo que as derivações da via ligam a portos fluviais no Mondego (nomeadamente Porto da Raiva e Penacova), podendo o restante percurso até Coimbra ser por via fluvial. Ainda que haja caminhos na outra margem, estes parecem dirigir-se para noroeste e não para Coimbra, o que fragiliza ainda mais esta hipótese. Estes acabam inevitavelmente por ter de cruzar a via proveniente de Viseu rumo a Coimbra, podendo seguir por esta até essa cidade, mas as diversas inflexões do percurso não se coadunam com a existência de uma via independente ligando Coimbra a Bobadela.

Se existem dúvidas no destino final da estrada, o local onde estrada cruzava o Rio Alva recolhe unanimidade, apontando para a área da Ponte da Mucela, tradicional ponto de passagem desde a Idade Média. No Monarquia Lusitana, o Fr. Francisco Brandão transcreve uma inscrição que estava colocada na ponte medieval, comemorando a sua construção no ano de 1295, durante o o reinado de D. Dinis. No entanto, a identificação de alguns silhares romanos reutilizados na construção medieval, permitia sustentar a hipótese de uma ponte romana anterior, talvez mais a jusante, próximo do povoado romano da Moura Morta, onde a travessia é bem mais facilitada.

Alterações introduzidas no traçado da Via Conímbriga – Bobadela na travessia do Rio Alva (linha vermelha), junto ao povoado romano de Moura Morta e a Serra do Bidueiro junto da mamoa de S. Pedro Dias.

O povoado assenta num meandro do rio Alva que rodeia o assentamento por todos lados menos do lado sul, por onde se acedia ao local. Contudo, as fortes arribas na outra margem inviabilizam a passagem junto ao assentamento. No entanto, entre este e a ponte, existe uma zona mais favorável ao cruzamento do rio, aproveitando depois uma lombada que ali existe para iniciar a ascensão da encosta em suaves patamares. Aliás a passagem neste local poderia até não exigir a construção de uma ponte, sendo que nesse caso, os silhares romanos poderão ter vindo do próprio povoado de Moura Morta que dista apenas cerca de 1 km da ponte actual.

Mas independentemente da questão se haveria ponte romana ou não, tudo indica que a travessia seria neste local pelas razões apontadas e também porque este traçado vem acertar a marcação miliária entre Conímbriga e Bobadela. De facto, a distância medida de Conímbriga ao Alva pelo percurso proposto totaliza 29 milhas (valor típico entre etapas), sendo que a milha 27 corresponde ao alto da portela da Serra do Bidueiro, onde se regista um monumento megalítico, a mamoa de S. Pedro Dias (local de romaria em torno da capela ali existente), evidenciando mais uma vez a grande antiguidade deste trajecto, pelo menos como caminho de pé-posto.

Esta correção permite também acertar a marcação miliária com a única paragem comprovada arqueologicamente no percurso entre o Alva e Conímbriga, a estação viária romana da Eira Velha (infelizmente recentemente destruída pela construção do troço Coimbra-Tomar da A13, em mais um atentado perfeitamente evitável), localizada a 22 milhas do Rio Alva e a sete milhas de Conímbriga. Esta via continuava para ocidente até Soure (possível cais fluvial do Mondego), onde apareceu um miliário.

A propósito de miliários, nesta via não se contam mais que três marcos, todos identificados nas proximidades de Seia, assinalando, aliás, o cruzamento com outro grande eixo viário, a via oriunda de Viseu que ligava ao Castro de São Romão (c. Seia), criando dúvidas sobre qual destas estradas seria assinalada por estes marcos.

O único que ainda mantém parte da epígrafe é de Maximiano e indicada XXI milhas, distância compatível com Bobadela e, mais ainda, com Celorico da Beira, que nesse caso, indicaria a distância ao Rio Mondego. No entanto, não podemos excluir a hipótese deste marco indicar a outra rota para Viseu, sendo que as 21 milhas são compatíveis com a distância daqui à travessia do Rio Dão na Ponte Romana de Alcafache. Actualmente encontra-se deslocado no jardim de uma casa de turismo rural em Paços da Serra. Recentemente foi identificado uma outro miliário (anepígrafo) junto do cemitério de Santa Comba que estará muito provavelmente in situ pelo que é decisivo par ao acerto da marcação miliária desta via. O terceiro foi identificado ali próximo, em Vila Chã, reutilizado como suporte de uma varanda de uma casa da aldeia, cuja morfologia e proximidade a Santa Comba sustenta a hipótese de se tratar de outro miliário.

Voltando à travessia do Alva na Mucela, o sítio da Moura Morta não apresenta ocupação da Idade do Ferro pelo que se trata de uma estabelecimento de fundação romana para apoio e controlo da via (eventualmente uma statio). No entanto, enquanto não houver um escavação do povoado nada mais se pode acrescentar.

The Bracara-Asturica Itinerary through «Gerês»

This itinerary from Braga to Astorga (Via XVIII of the Itinerary of Antonino) integrates one of the best preserved stretches of the route in Portugal, crossing the Serra do Gerês (where it is called “Geira”), heading towards Galicia through Portela do Homem. The Portuguese part is relatively well studied, with a consolidated route based on the great number of existing milestones, but in the Spanish part there are still great uncertainties, both in the actual route chosen and the location of the intermediate stations. In the attempt to clarify the route to Astorga, and applying the methods developed for the survey of the Portuguese part, we propose the following solution.

Tracing of the XVIII itinerary of Antonino with the respective stopping stations.

The problem is centred in the distances between stages that do not match the distance measured on the ground. Summing all the stages we get 218 miles, however the total distance indicated in the itinerary is 215 miles, a divergence never fully explained and which opens the possibility of errors in the miles indicated in one or more stages. If for Aquis Originis and Aquis Querquennis there seems to be no doubt in their location respectively at Banhos do Rio Caldo and Baños de Bande, from there on the doubts grow. According to the Itinerary, the next station, Geminas, is located 16 miles from
Aquis Querquennis but following the route (confirmed by milestones), this value is insufficient to cover the distance between Baños de Bande and Castrum of Torre de Sandiás, the most likely location of this station. This difference is also confirmed by the milestones found nearby since the milestone of Casasoá indicates 73 miles to Braga, a value in accordance with the milestone count. Thus, we would have to correct the 16 miles indicated for this stage for the 17 measures, making a total of 70 miles to Braga.

The location of the following stations is still under great discussion and no consensual solution is in sight. The proposals of Rodriguez Colmenero (et al. 2004) continue to be the basis of what is written on the subject, maintaining the great confusion installed by launching the theory of different values of mileage that supposedly would be used in different stretches of track, depending on the characteristics of the terrain. This was an attempt to justify the various inconsistencies in the proposals presented, creating a deadlock that remains to this day. Later studies came to dismantle this thesis because the only measure verified on the ground corresponds to the so-called “classic” mile, which is around 1500m.

The clear excess of miles in this itinerary, making it necessary to place two stations very close to each other seemed to make the hypothesis of an error in the miliary counting much more likely.

Continuing the route, Salientibus could be in Vigueira de Abaixo (milestones), 18 miles from Geminas (Torre de Sandiás). Consequently, the next station, Praesidio, would be 18 miles ahead, distance which puts this station in Pobra de Tivres, in a strategic place since it was located between the two main Roman bridges, Ponte Navea and Ponte de Bibei (this one still standing!). After crossing the Bibei river, the route ascended to Larouco and from here, headed to Ponte da Cigarossa (also presenting Roman foundations) where Nemetobriga should be located. The recent discovery in 2022 of a milestone of Nero during works near the bridge, reconfirms the passage of the XVIII Itinerary in this place, which is exactly 120 miles away from Braga (meanwhile the milestone was placed in its probable original location at the bridge entrance).

The main problem lies in the next stage, between Nemetobriga and Foro, for which the Itinerary indicates the distance of 19 miles. However, this value seems too high since adding up all the stages until Bergido (undoubtedly located in Castro Ventosa, west of Cacabelos), we get a total of 50 miles (19+18+13), a value that greatly exceeds the distance between Cigarrosa Bridge and Castro Ventosa which is no more than 39 miles.

This difference of 11 miles must be justified by an error in the Itinerary. Now, analyzing the intermediate distances, everything indicates that this error can only be in the Nemetobriga to Foro leg that should be corrected to 8 miles (possible confusion between the numerals XVIIII and VIII). In this way, we reach the Foro station near the so-called villa of San Salvador in the place of Proba in Barco de Valdeorras. The site was excavated and then reburied, but it was found to be a vicus viarum, located next to the via, where a milestone also appeared. A votive inscription placed by a member of the VII Gemini Legion reinforces the passage of the Roman road here.

The distances to the following stations seem to be correct, with Gemestario located 18 miles from Foro and 13 miles from Bergido, a position which corresponds to the Alto da Portela de Aguiar in a mountain range called Sierra de Encina da Lastra, which defines de geographical border between the provinces of Galicia and Asturias. From here, the route descends to the valley of the river Sil and continues straight up to the Ventosa castrum, where it joins the Lugo-Astorga road. Here it curves eastwards for another twenty miles to Interamnio Fluvio or Intereraconio Flavio (different spellings of the same station), most probably located close to Bembibre, next to the junction of the rivers Noceda and Boeza, a position that fits a name as “Interamnio Fluvio“.

From Bembibre the route follows more 30 miles up to Astorga, passing Ribeira de Folgoso, Torre del Bierzo, San Juan de Montealegre, Manzanal del Puerto and Brimeda, a route marked by several milestones.

Thus, the survey of the route and the milestone sequence points to the following proposal for the location of the stations: Salientibus (Vigueira de Abaixo, XVIII), Praesido (Pobra de Trives, XVIII), Nemetobriga (Ponte da Cigarrosa, XIII, 120 miles to Braga), Foro (VIII, Pobra de Barco), Gemestario (Alto da Portela de Aguiar, XVIII) and Bergido (Castro Ventosa, Cacabelos, XIII), See route description here.

https://viasromanas.pt/#via_nova

O Itinerário Bracara-Asturica pela Serra do Gerês

Este itinerário de Braga a Astorga (Via XVIII do Itinerário de Antonino) integra um dos troços melhor preservados da via em Portugal, cruzando a Serra do Gerês (onde é designada por “Geira”), rumo à Galiza pela Portela do Homem. A parte portuguesa está relativamente bem estudada, com percurso consolidado baseado no grande número de miliários existentes, mas na parte espanhola subsistem ainda grandes incertezas, quer no seu traçado quer na localização das estações intermédias. Na tentativa de aclarar o percurso até Astorga, e aplicando os métodos desenvolvidos para o levantamento da rede na parte portuguesa, propõe-se a seguinte solução.

Traçado do itinerário XVIII de Antonino com as respectivas estações de paragem.

O problema centra-se nas distâncias entre etapas que não casam com a distância medida no terreno. Somando todas as etapas obtemos 218 milhas, no entanto a distância total indicada no itinerário é de 215 milhas, divergência nunca cabalmente explicada e que abre a possibilidade de existirem erros nas milhas indicadas em uma ou mais etapas. Se para Aquis Originis e Aquis Querquennis não parece haver dúvida na sua localização respectivamente a Banhos do Rio Caldo e Baños de Bande, a partir daí as dúvidas crescem. Desde logo, a estação seguinte, Geminas, estaria segundo o Itinerário a 16 milhas, mas fazendo o percurso (confirmado por miliários) verifica-se que esse valor é insuficiente para atingir o Castro de Torre de Sandiás, a sua mais que provável localização. Essa diferença é aliás confirmada pelos miliários encontrados nas proximidades dado que o miliário de Casasoá indica 73 milhas a Braga, valor em conformidade com a contagem miliária. Deste modo, haveria que corrigir as 16 milhas indicadas para esta etapa para as 17 medidas, perfazendo um total de 70 milhas a Braga.

A localização das estações seguintes continua em grande discussão sem vislumbre de consenso. As propostas de Rodriguez Colmenero (et al. 2004) continuam a ser a base do que se escreve sobre o tema, mantendo a grande confusão instalada ao lançar a teoria dos diferentes valores de milha que supostamente seriam utilizadas em diferentes troços da via, em função das características do terreno. Tentava-se assim justificar as várias incoerências nas propostas apresentadas, criando um impasse que permanece até hoje. Estudos posteriores vieram desmontar esta tese porque a única medida verificada no terreno corresponde à milha dita “clássica” que ronda os 1500 m. O claro excesso de milhas neste itinerário (obrigando a colocar duas estações muito próximas um da outra) parecia tornar a hipótese de haver erro na contagem miliária muito mais verosímil.

Continuando a contagem, Salientibus poderia estar em Vigueira de Abaixo onde há miliários e era vencida a milha 18 a Geminas (Torre de Sandiás). Consequentemente, a estação seguinte, Praesidio,  estaria 18 milhas adiante, distância que coloca esta estação próximo de Pobra de Tivres, um local estratégico dado que se encontra entre as grandes pontes de construção romana designadas por Ponte Navea e Ponte de Bibei (esta ainda pé!), a cerca de 3 milhas desta última.

Depois de cruzar o Rio Bibei ascendia a Larouco e daqui seguia em direcção à Ponte da Cigarossa (também com alicerces romanos) onde se deveria localizar Nemetobriga. A recente descoberta em 2022 de um miliário de Nero (?) durante umas obras junto à ponte, vem reconfirmar a passagem do Itinerário XVIII neste local que se encontra a exactamente 120 milhas de Braga (entretanto o marco foi colocado no seu provável local original à entrada da ponte).

O principal problema encontra-se na etapa seguinte, entre Nemetobriga a Foro, para a qual o Itinerário indica a distância de 19 milhas. Ora, este valor parece demasiado elevado dado que somando todas as etapas até Bergido (sem dúvida localizado no Castro Ventosa, a oeste de Cacabelos), obtemos um total de 50 milhas (19+18+13), valor que excede largemente a distância entre a a Ponte da Cigarrosa e o Castro Ventosa que não se contam mais que 39 milhas.

Esta diferença de 11 milhas tem de ser justificada por um erro no Itinerário. Ora, analisando as distâncias intermédias, tudo indica que esse erro só pode estar na etapa de Nemetobriga a Foro que deverá ser corrigida para 8 milhas (ainda que seja difícil explicar a troca do numeral VIII por XVIIII). Deste modo, atingimos a estação de Foro junto da chamada villa de San Salvador no lugar da Proba em Barco de Valdeorras. O sítio foi escavado e logo enterrado novamente, mas apurou-se que se trata de um vicus localizado junto da via, onde aliás apareceu um miliário. Uma inscrição votiva colocada por um membro da VII Legião Gémina reforça o carácter viário do local.

As distâncias das estações seguintes parecem estar correctas, com a Gemestario localizada a 18 milhas de Foro e a 13 milhas de Bergido, posição que corresponde ao Alto da Portela de Aguiar na Serra da Encina da Lastra que serve de divisão geográfica entre as províncias da Galiza e Astúrias. Daqui desce ao vale do rio Sil seguindo reto até ao castro Ventosa, onde entronca na via Lugo-Astorga. Aqui inflectia para leste, seguindo por mais vinte milhas até Interamnio Fluvio ou Intereraconio Flavio (diferentes grafias da mesma estação), possivelmente localizada em Bembibre, junto da confluência dos rios Noceda e Boeza, posição mais adequada ao topónimo Interamnio Fluvio (entre os dois rios).

De Bembibre seguia por mais 30 milhas até Astorga, passando em Ribeira de Folgoso, Torre del Bierzo, São João de Montealegre, Manzanal del Puerto e Brimeda, trajecto que é assinalado por diversos miliários.

Deste modo, o levantamento do percurso e da sequência miliária aponta para a seguinte proposta de localização das estações: Salientibus (Vigueira de Abaixo, XVIII), Praesido (Pobra de Trives, XVIII), Nemetobriga (Ponte da Cigarrosa, XIII, 120 milhas a Braga), Foro (VIII, Pobra de Barco), Gemestario (Alto da Portela de Aguiar, XVIII) e Bergido (Cacabelos, XIII), Ver do percurso aqui.

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