A distribuição dos miliários conhecidos em território nacional permite não só identificar as principais rotas em período romano, assim como o grau de investimento feito em cada uma delas. Destacam-se as duas grandes rotas para Mérida, uma partindo de Lisboa, seguindo por Évora, Estremoz e Elvas, e a outra partindo de Santarém, seguindo por Ponte de Sor, Alter do Chão e Campo Maior. Ainda na parte sul do território verifica-se alguma concentração no aro de Beja, sede administrativa no período romano, e próximo de Moura, estes associados ao cruzamento da via oeste-este ligando Beja a Sevilha com a via norte-sul entre Évora e Mértola.
Seguindo para norte temos a grande rota de Lisboa ao Porto com diversos miliários assinalando a passagem da via em Alenquer, Santarém, Tomar e Coimbra. Para o interior destaca-se claramente Viseu como grande nó viário das Beiras. O alinhamento dos miliários mostra claramente dois grandes eixos que se cruzavam neste local. O primeiro corresponde ao eixo norte-sul que aglomera as diversas rotas provenientes das travessias do rio Douro, bifurcando aqui rumo a Coimbra e Bobadela. O segundo eixo liga o litoral (partindo do Cabeço do Vouga na antiga paleo-foz do rio) a Viseu, seguindo depois para a travessia da Serra da Estrela rumo a Mérida por Belmonte e Idanha-a-Velha.
Diversos miliários assinalam a rota de ligação do Porto ao principal nó viário a norte do Douro – Braga. Aliás, a posição absolutamente estratégica deste local poderá estar na origem da escolha deste local para a fundação de Bracara Augusta, logo nos alvores do período Imperial. A riqueza metalífera da região norte de Portugal e da Galiza justifica o contínuo investimento na reparação das vias pelos sucessivos imperadores, esforço reflectido no aparecimento na mesma milha de vários miliários de diferentes períodos.
Tudo indica que a grande quantidade de miliários conhecidos nas rotas que partiam de Braga se deva ao facto de estas vias contarem com marcos de milha em milha, prática inexistente nas restantes vias do país, onde os miliários são bem mais escassos. No mapa essa grande densidade de miliários evidencia claramente as três grandes rotas que partiam de Braga para norte, a via para Santiago de Compostela por Ponte de Lima e Tui, a via para Astorga pela Serra do Gerês e a via para Chaves e Bragança. Realce ainda para o grande número de marcos nas rotas de Chaves para norte rumo a Xinzo de Limia, interligando duas das rotas acima referidas.
Neste panorama geral sobre a marcação miliária no território nacional destaca-se a ausência de miliários nas regiões do Baixo Alentejo e Algarve, facto que poderá ser justificado pela menor necessidade de obras de restauro, dado que são áreas de baixa pluviosidade. A única excepção é um miliário que apareceu na região do Algarve, em Bias do Sul (Olhão), tradicionalmente associado à via de Faro a Tavira, mas que poderia antes indicar o ponto terminal da grande rota proveniente de Alcácer do Sal rumo ao Algarve, podendo na antiguidade corresponder a um porto marítimo. O mesmo acontece com o miliário de Alfeizerão (na fig.1 o miliário isolado a norte das Caldas da Rainha) que também deveria assinalar um porto de mar.
Mais em :
Soutinho, P. (2024). Origem e Resiliência da Rede Viária Romana: uma viagem no tempo centrada na viação antiga. Atas do III Colóquio Viário do Marão, Biblioteca Municipal de Vila Real, 49-64