Por comparação com outros casos similares, e embora faltem dados precisos para o Porto, foi provavelmente com a época romana que foi traçado a primeira estrutura urbana.
O sítio, denominado Cale no Itinerário de Antonino (séc. III - IV) seria uma estação intermediária na via que ligava Olisipone (Lisboa) a Bracara Augusto (Braga). Cale, relacionada com o Porto pelo Padre Pereira de Novaes foi tomada por Perpena, lugar-tenente de Sertório, durante as lutas contra Roma em 74 a.C. A respeito da localização daquela via, apenas se poderão levantar hipóteses, à semelhança de outros autores, pois não houve ainda escavações arqueológicas que pudessem documentar troços da mesma via. As sugestões mais tentadoras baseiam-se numa análise topográfica, procurando-se conjugar vários factores, como a acessibilidade e a proximidade dos locais que procurava unir, elegendo-se o vale do Rio da Vila como eixo mais penetrável, podendo aproveitar-se o leito dos Mercadores, continuando pela Bainharia e bifurcando-se sensivelmente no local onde é a Cruz do Souto, que cremos de grande antiguidade por definir duas saídas muito utilizadas pelos romanos: para Braga, através da actual R. dos Almadas e outra, seguindo pela porta de Vandoma, por Valongo até Penafiel, onde se documentam troços e pontes da via romana. Mesmo quando se aponta para uma possível passagem do Douro perto do vale do rio Frio (Miragaia), admite-se uma ligação ao Rio da Vila. A partir daqui, é forçoso admitir duas hipóteses: pela margem direita do rio, de pendor porventura mais suave, num traçado talvez próximo da posterior rua das Flores, ou no espaço entre esta e o Rio da Vila, onde mais tarde se traça a rua das Congostas.
O povoamento, documentado na rua de D, Hugo, revelou uma sucessão de ocupação entre Tibério - Cláudio (14 - 54), época em que provavelmente terá ocorrido uma organização urbana, e Trajano (98 - 120), período certamente pautado por várias reformas periódicas.
Como elementos de suporte desta hipótese, citam-se as colunas romanas de mármore e granito levadas para Santiago de Compostela, para a construção da Catedral, consagrada em 899 no tempo de Afonso III que, juntamente com a descoberta, entre outros fragmentos, de colunas em calcário e duma Ara votiva consagrada aos Lares Marinhos por Quinto Úlpio Flaco encontradas na área da Sé, aquando das demolições de 1940, levam a percepcionar a existência de uma estrutura urbana neste local, durante a época romana.
Também nos arcanjos da Capela-mor da Sé, feitos nos inícios do séc. XVII pelo Bispo D. Gonçalo de Morais, teriam desaparecido três inscrições presumivelmente romanas, de que nos da conta Manuel Pereira de Novaes:"( ) en nuestro ciudad, en las espaldas de la Capilla de esta Santa Iglesia (que fué la que derribò para haser la nueba el illustrissimo Señor D. Fray Gonzalo de Moraes) en una piedra de esse Edificio viò y leiò unas letras que desian ossi: IVLIVS". Esta inscrição seria a mesma que nos deixou referida o Dr. João de Barros, nos fins do séc. XVI, ao dar a conhecer a existência de uma inscrição romana na Sé do Porto onde se lia C. IVLIVS, não se sabendo se seria votiva, funerária, ou monumental. As outras duas igualmente desaparecidas, eram ambas funerárias, uma de Cássia Dútia e outra de Julia Avita. Para além destes, houve outros achados que documentam a presença romana, testemunhando uma parcela das suas actividades produtivas e artesanais, através das mós, cerâmicas e vidros desta época, encontrados nas referidas demolições, nas escavações do Seminário Maior em 1955, e na Sé em 1983 nas obras do CRUARB.
O grande salto urbanístico a nível da ocupação deve ter ocorrido nos fins do séc. III, inícios do séc. IV, quando se documentam os alicerces de uma muralha construída no séc. III que terá alterado construções pré-existentes, cortando casas e caminhos, diminuindo assim a espaço urbano. Embora a seu traçado seja desconhecido, poder-se-á presumir que teria um perímetro semelhante ao da cerca românica, que sabemos ter sofrido varias reparações.
Apesar desta muralha, verifica-se, pelo menos no séc. IV, uma expansão urbana, já que terão aparecido vestígios desta época no Morro da Cividade (escavações de Mendes Corrêa em 1932), na zona da Ribeira (escavações de 1983) e na Casa do Infante (escavações em curso). Para o espaço que nos interessa, teriam ficado for a do reduto as acessos desde o rio Douro ao cimo de Pena Ventosa, bem como a ligação para a estrada de Braga. Seria interessante verificar se a organização do espaço em volta do Rio da Vila, nos tempos anteriores à abertura da R. Mouzinho da Silveira, conservava traços do cadastro romano, através de uma analise exaustiva das poucas e limitadamente documentadas plantas que existem.